Com o aumento das temperaturas e o avanço da urbanização, pensar o futuro das cidades da Amazônia passa pela forma como elas são construídas. Em Belém, onde o calor e a umidade são constantes, o desafio é criar espaços que convivam com o clima. Neste mês de novembro, os termômetros devem variar entre 33°C e 34°C, segundo o Climatempo, em meio a dias de sol forte e chuvas passageiras que reforçam a urgência de soluções arquitetônicas adaptadas à região.
Segundo o arquiteto e urbanista Rodrigo Lima, coordenador do curso de Arquitetura e Urbanismo da Faci Wyden, enfrentar o calor nas cidades exige investir em tecnologias passivas e soluções simples que aproveitam os recursos naturais, como beirais, brises e aberturas para ventilação, capazes de refrescar os ambientes e reduzir o consumo de energia.
“Uma das principais estratégias é a ventilação cruzada, obtida com janelas e portas posicionadas em lados opostos, permitindo que o vento circule continuamente pelos espaços, sejam casas ou apartamentos. Outra solução é a fachada ventilada, usada em edifícios, que funciona como uma ‘segunda pele’: cria uma câmara de ar entre a parede e o revestimento externo, onde o ar frio entra pela base, aquece e sobe, dissipando o calor antes que atinja o interior. O sistema, além de reduzir o uso de ar-condicionado, também protege a estrutura”, explica o professor.
Elementos tradicionais da arquitetura de Belém também voltam a ganhar relevância, como os brises , cobogós e beirais longos. Os brises funcionam como filtros de raios solares, bloqueando parcialmente a luz e o calor antes que entrem no ambiente. Assim como os cobogós, que são blocos vazados de cerâmica ou cimento que deixam o ar e a luz natural passarem sem deixar o sol incidir diretamente sobre os ambientes.
Os cobogós, material muito comum entre as décadas de 1940 e 1970, e largamente utilizados na arquitetura moderna brasileira, em casa e edifícios em Belém. Este material fez parte da estética popular conhecida como “raio que o parta”, um estilo que misturava elementos modernistas nas fachadas, como, marquises e brises , além dos famosos mosaicos decorativos de casos de azulejos das casas, com adaptações ao clima amazônico.
Além do valor decorativo, esses elementos ajudavam a refrescar as casas, mostrando que a arquitetura popular e local buscou soluções criativas para o clima. “Esses recursos promovem sombreamento e conforto térmico, reduzindo a dependência do ar-condicionado, que não era tão popular antigamente, por exemplo”, acrescenta Lima.
A urgência de deixar o solo poroso – Belém é uma cidade cortada por 14 bacias hidrográficas, parte delas seus canais foram aterrados e canalizados em concreto ao longo do tempo. Esta impermeabilização do solo somada a grandes áreas de pavimentação em asfalto e concreto pela cidade, tem contribuído para a sensação de aumento de temperatura e dos alagamentos.
Segundo o arquiteto, a falta de áreas verdes, com vegetação impede que o solo absorva e contribui para o aumento de áreas de alagamento e elevação da temperatura na cidade. “Soluções como jardins de chuva, calçadas com materiais drenantes e asfaltos mais permeáveis ajudam a absorver parte da água da chuva e reduzem o impacto dos eventos climáticos extremos”, explica.
Para que essas soluções saiam do papel, Lima defende o fortalecimento das políticas públicas e o cumprimento das normas de eficiência energética e desempenho térmico. “É fundamental que o poder público fiscalize e exija o cumprimento de normas como a NBR 15575/2021, que trata do desempenho térmico das edificações. Também é preciso investir na capacitação de profissionais e no uso de ferramentas computacionais que simulem o comportamento térmico das construções antes mesmo de elas serem erguidas”, destaca.
Ele também propõe incentivos econômicos que envolvam diretamente a população. “A criação de um IPTU verde, por exemplo, pode motivar o cidadão a manter áreas arborizadas e permeáveis em seu terreno. Pequenas ações geram grandes resultados quando pensadas coletivamente”, observa.
O professor ressalta que a arquitetura amazônica já traz respostas que o futuro precisa reaprender a valorizar. Casas ribeirinhas sobre palafitas, feitas de madeira e cercadas por varandas ventiladas, são exemplos de soluções adaptadas ao calor e à umidade da região. “Essas construções tiram apenas o necessário da floresta, mantém a ventilação natural e suas técnicas construtivas reduzem a temperatura interna.
São saberes tradicionais que ensinam muito sobre a convivência com o clima”, afirma. Para ele, o futuro da construção na Amazônia está em unir saberes tradicionais e inovação tecnológica. “A arquitetura do futuro amazônico é aquela que aprende a conviver com o clima, sol e chuva, e não a combatê-lo. É uma arquitetura resiliente, de tecnologias passivas e integrada ao bioma, que transforma o desafio climático em oportunidade de inovação”, conclui.
Por: Assessoria de Imprensa
Fonte: Portal Santarém
