O Ministério Público Federal (MPF) instaurou inquérito civil e procedimento criminal para investigar discursos racistas e incitadores de ódio contra povos indígenas do Baixo Tapajós, no Pará. A medida foi adotada após inúmeras fontes compartilharem com a instituição áudios enviados em aplicativo de mensagens, nos quais dois homens questionam a legitimidade étnica de indígenas da Terra Indígena Cobra Grande, localizada no município de Santarém, no Pará para incitar outras pessoas contra o direito deles ao território, liberdade e segurança.
Os áudios contrariam portarias assinadas no dia cinco deste mês pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), que reconhece a posse permanente dos indígenas Arapium, Jaraqui e Tapajó sobre a TI Cobra Grande, assim como aos indígenas Borari e Arapium à TI Maró, também localizada na região. Os discursos tentam deslegitimar a identidade étnica dos integrantes das comunidades ao afirmar que eles estariam se autodeclarando indígenas, sem que o fossem.
As falas discriminatórias e inflamatórias foram ditas em um contexto de reação a uma operação de fiscalização ambiental realizada na TI Cobra Grande e no Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Lago Grande. A ação ocorreu entre os dias 10 e 13 deste mês e foi executada pelo MPF, Polícia Federal (PF), Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama).
A operação, que já vinha sendo planejada há meses, foi impulsionada pelo MPF por inquéritos civis que apuram a falta de fiscalização e segurança coletiva no PAE Lago Grande – que é cenário de graves e constantes ameaças a defensores e defensoras de direitos humanos -, além de possíveis invasões à TI Cobra Grande.
Ou seja, ao contrário do que alegam os autores dos áudios, a operação não teve nenhuma ligação com os documentos declaratórios assinados pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski.
Logo depois dos áudios, o MPF passou a receber postagens de várias outras pessoas com insinuações racistas, afirmando que os indígenas da TI Cobra Grande fingiam ser indígenas, além de outras em tom de ameaça contra a segurança daquela coletividade, insinuando algum tipo de retaliação.
Ainda, o MPF recebeu foto de uma placa fixada na entrada da Vila Socorro, próxima à TI Cobra Grande, de nítido caráter discriminatória e segregatório, cujo conteúdo proibia entrada de indígenas.
O MPF destaca que devem ser combatidas todas as formas de racismo e discurso de ódio, como aqueles que questionem o princípio da autoidentificação ou desqualifiquem a identidade cultural de determinado grupo, com o objetivo de induzir ou incitar à anulação ou à restrição de seus direitos, tais como o direito ao território, à segurança e à liberdade.
Providências – Diante das falas e ações cometidas pelos dois homens, o MPF instaurou procedimento criminal para apurar a ocorrência de crime de racismo contra indígenas do Baixo Tapajós, especialmente da TI Cobra Grande. Além disso, está investigando no âmbito cível a prática de discurso de ódio e violação aos direitos da personalidade, também contra as mesmas comunidades tradicionais.
A instituição também reitera que vai voltar a cobrar dos órgãos competentes a realização de fiscalizações periódicas na área, como forma de coibir ameaças a lideranças do PAE Lago Grande e desestimular infratores ambientais.
Com informações do MPF