O acordo conhecido como Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) da Carne completou 15 anos de lançamento no Pará com anúncios de atualização das regras, para facilitar a participação de mais frigoríficos.
Também foram anunciadas iniciativas contra as empresas que descumpriram as regras ou que não aderiram ao TAC, incluindo pedidos à Justiça de que sejam aplicadas multas em valores que superam R$ 16,2 milhões contra frigoríficos.
Os anúncios foram feitos nesta quinta-feira (22), na sede do Ministério Público Federal (MPF) em Belém, com a presença de representantes da instituição, de pecuaristas e frigoríficos integrantes do TAC e de organizações governamentais e não governamentais apoiadoras da iniciativa.
As medidas anunciadas buscam reforçar o alcance do principal objetivo do TAC, que é o de garantir o cumprimento da legislação socioambiental e fundiária na cadeia produtiva da pecuária na Amazônia, permitindo que o mercado possa vender aos consumidores carne apenas de origem legal.
As novidades da nova versão do TAC – O texto do TAC, que vem ganhando a adesão de empresas desde julho de 2009, agora está mais simples e objetivo. Os detalhes técnicos sobre como as obrigações devem ser implementadas e geridas foram concentrados em um documento chamado Protocolo de Monitoramento.
Caso seja necessária a aplicação de multas, agora elas são proporcionais à extensão das irregularidades eventualmente cometidas, conforme resultados de auditorias. Antes, na primeira versão do TAC, o acordo não previa esse equilíbrio entre o dano e a reparação.
O MPF também ressaltou que as regras do TAC foram padronizadas em toda a Amazônia, para permitir que as empresas possam gerenciar o cumprimento de seus deveres com mais eficiência e que possa haver igualdade de concorrência entre os frigoríficos. Além disso, essa padronização facilita a análise comparativa entre os resultados das companhias (detalhes sobre o primeiro ciclo unificado de auditorias).
Atuação contra os sem auditoria – O MPF anunciou que entrou na Justiça contra quatro frigoríficos que assinaram o TAC mas não apresentaram as auditorias previstas no acordo. Como o TAC tem força de sentença judicial, o MPF pediu para a Justiça Federal obrigar as empresas a cumprirem esse compromisso, sob pena de multa e de outras punições previstas.
Foram processados os seguintes frigoríficos:
• Frigorífico Vitória (C. E. Mendonça) – multa de R$ 3.798.144,00. Processo 1015182-35.2024.4.01.3902;
• Frigosan (Frigorífico Santarém Ltda – EPP) – multa de R$ 5.450.112,00. Processo 1015183-20.2024.4.01.3902;
• Frigorífico Ouro Verde – multa de R$ 769.953,60. Processo 1036149-10.2024.4.01.3900;
• Frigorífico Mararu Eireli – ME – multa de R$ 6.219.417,60. Processo 1015638-82.2024.4.01.3902.
Se as empresas não pagarem as multas, o MPF pede que a Justiça determine a penhora dos estabelecimentos comerciais e a expropriação de bens das companhias.
O MPF anunciou que vai enviar recomendações a varejistas que compram produtos dos frigoríficos processados e aos bancos financiadores dos frigoríficos processados. As recomendações, que são uma espécie de alerta para evitar que o caso tenha que ser levado à Justiça, vão apontar para a necessidade de que esses varejistas e bancos suspendam as tratativas com as empresas processadas.
Também foi anunciado, pelo MPF, que a cada novo ciclo de auditorias serão ajuizadas novas ações contra empresas signatárias do TAC que não apresentarem os resultados das auditagens.
Atuação contra quem não assinou o TAC – Em relação aos frigoríficos que têm atuação comercial relevante e que não assinaram TAC, desde 2018 o MPF vem pedindo que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas) fiscalizem essas empresas, para verificação do cumprimento da legislação.
Confira os frigoríficos alvo das fiscalizações solicitadas pelo MPF, no Pará e em outros estados
Recomendação para cancelamento de crédito – No evento, o MPF registrou que este ano enviou recomendação para que bancos promovam a desclassificação e a liquidação antecipada das operações de crédito autorizadas para propriedades localizadas em terras indígenas, unidades de conservação e florestas públicas na Amazônia.
A recomendação foi enviada para Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco da Amazônia, Banco De Lage Landen Brasil, Banco Sicredi, Bradesco, Itaú e Santander.
Na recomendação, o MPF destacou que o desenvolvimento de atividades agropecuárias nessas áreas protegidas pode, conforme o caso, caracterizar crime de invasão de terras públicas ou o delito de causar dano em unidade de conservação; e que a responsabilidade civil por danos ambientais é objetiva e solidária entre todos os envolvidos, o que incluiria, nestes casos, os bancos (mais informações sobre a recomendação).
Programa de Requalificação Comercial – Nesta quinta-feira, representantes do MPF e de instituições apoiadoras do TAC da Carne também compartilharam experiências sobre a fase inicial do Programa de Requalificação Comercial. Resultante do TAC da Carne, o programa possibilita a reinserção de pecuaristas ao mercado, desde que se comprometam a isolar e não utilizar as áreas desflorestadas sem autorização dos órgãos competentes, suspendendo imediatamente as atividades em área desmatada irregularmente após 22 de julho de 2008, em cumprimento ao Código Florestal.
A iniciativa foi idealizada pelo MPF e pela Associação dos Criadores do Pará (Acripará) em Termo de Cooperação Técnica assinado em 2020 (confira a íntegra) e foi concretizada no último dia 16, com o lançamento oficial do programa pelo governo do estado. A novidade é coordenada pela Semas e integra ações coordenadas com a Agência de Defesa Agropecuária do Pará (Adepará).
Resultados graças a trabalho conjunto – Em cinco ciclos de auditorias na pecuária no Pará, o percentual de animais comercializados com alguma inconformidade caiu de 10,4% do total de transações auditadas para 4,8%. O quarto e o quinto ciclos contaram com cinco empresas que atingiram 100% de conformidade nas transações auditadas, incluindo empresa que tinha 31% de inconformidades no primeiro ciclo de auditorias (saiba mais sobre os ciclos de auditorias).
O modelo do TAC iniciado no Pará foi expandido para outros estados da Amazônia e passou a ser pauta de atuação do Grupo de Trabalho Amazônia Legal, do MPF. A iniciativa ganhou apoio administrativo e técnico de forma estruturada, por meio da articulação Boi na Linha (confira um histórico desse trabalho), e as diretrizes são continuamente aperfeiçoadas e unificadas em toda a Amazônia por meio dos protocolos de monitoramento e de auditoria.
Desde outubro de 2021, o MPF no Pará conta com o Comitê de Apoio ao TAC (CAT), uma instância responsável por dar suporte à efetiva implementação deste compromisso e à ampliação do seu alcance, que atua provendo apoio técnico, científico, consultivo e instrutivo, buscando melhorar a eficiência e transparência dos processos relacionados à implementação do TAC da Carne e viabilizando sua implementação e comunicação de forma estruturada e organizada frente aos atores privados.
Esse apoio foi formalizado por meio de um Termo de Cooperação Técnica entre a unidade do MPF no Pará, Amigos da Terra – Amazônia Brasileira (AdT) e Instituto de Manejo e Certificação Agrícola e Florestal (Imaflora), organizações que compõem a Secretaria Executiva (Secex) do comitê. Adt e Imaflora apoiaram o MPF na organização do evento alusivo aos 15 anos do TAC.
Fazem parte do CAT dois colegiados: a Câmara Técnica, composta por pesquisadores de universidades especialistas em geomonitoramento, e a Câmara Social, formada por representantes do setor da pecuária bovina e indústria, prestadores de serviço de geomonitormento e organizações da sociedade civil afins que atuam no estado. A Aliança Paraense pela Carne, uma dessas organizações, também apoiou a realização do evento referente aos 15 anos do TAC da Carne.
A Secex está trabalhando para expandir o modelo de apoio realizado pelo CAT à unidade do MPF no Pará para as unidades do MPF nos demais estados do Programa Carne Legal.
Desafios e perspectivas – Representantes do MPF, da AdT e do Imaflora apontaram os atuais desafios para o trabalho relativo ao TAC, que são: garantir que todo o rebanho paraense se submeta aos processos de auditorias, avançar com a implementação do TAC e das auditorias nos outros estados, reforçar a atividade repressiva dos órgãos ambientais e assegurar que as Guias de Trânsito Animal (GTAs) – documentos imprescindíveis para o monitoramento do cumprimento das obrigações – estejam conectadas com os Cadastros Ambientais Rurais (CARs) das fazendas.
Outro desafio bem complexo é a necessidade de implementar regras de monitoramento dos chamados fornecedores indiretos, que são as fazendas que não vendem gado diretamente para os frigoríficos, e sim vendem para outras fazendas.
Para aumentar a efetividade dos acordos, o MPF e instituições apoiadoras atuam para que mais empresas sejam signatárias do TAC. Além disso, o grupo do TAC visa estimular o uso das plataformas de rastreabilidade via GTA, implementar a rastreabilidade individual, garantir a requalificação dos produtores aptos, fortalecer a fiscalização e repressão, além de agregar esforços de varejistas e instituições financeiras.
Com informações do MPF